Nada mais se movia.
Calara-se o vento com o sol e fizera-se a noite quente e húmida.
As águas baixas moviam-se tranquilas no branco da Lua que enchia a ria e o ar farto de lodo nu.
O ar.
Quente, doce, aquoso.
Escorria-lhe na pele, queimando por fora o que ele havia incendiado por dentro.
Lá ao fundo, um barco, pequeno na distância que a separava do rolar intermitente do farol, deslizava quase silencioso.
Silêncio.
Não havia.
Mesmo quando nada se movia.
Podiam estar os parques vazios de miúdos a correr, podiam estar órfãos os bares de gente a beber, podiam os turistas do calor se esconder, podia toda a cidade parar para adormecer que haveria sempre um carro a travar, um comboio a passar, um semáforo a piscar, um barco a deslizar. Lento, longe, ligeiro… Quase em silêncio.
Sentiu-o ali, improviso, colado a si como o ar que da ria subia.
Sentia-lhe o corpo nu, felino. Conhecia-lhe todos os movimentos, todos os ritmos. Percorrera-o mil voltas e mil voltas nele se perdera.
Sentiu-se morrer.
Queimava-a o ar e queimava-a ele. Ali. Assim. Aquela perna, entre as suas. Aquela pressão, suave. Aquele corpo, nu. Contra o seu. Lentos. A perna. Para cima… Para baixo… Para cima… Para baixo… Para cima… Para cima… Cima… Cima… Até ao infinito!
– Volta para a cama. – Sussurrou-lhe ele no seu gemido, apertando-se contra ela, provando-se duro e quente.
Sentiu-se acordar.
Queria narrar-lhe as suas mil viagens mas calou-se nas promessas meigas dos seus beijos.
Queria gritar-lhe que já o sabia de cor, que dele fizera um mapa, que nunca mais se perderia mas esquecera-se-lhe a voz enrolada naquela língua não falada.
Queria falar-lhe do tempo que lhes passa lento, marcado pelo rolar intermitente do farol na ria vazia de lua cheia.
Mas calaram-na.
Calaram-na o vento e o sol enquanto ela se fazia quente e húmida.
Nada mais se movia.