Já ninguém dança slows

Engata-me.
Sim, engata-me.
Vá lá…
Estou certa que ainda te lembras de como se faz.
Há quanto tempo não me empurras a cadeira quando me sento à mesa? Devagar, a afundares lento o olhar no meu decote, a deslizares-te eterno no meu braço, converso em mim como se mais nada fosse neste universo?
Vá lá…
Sentas-te ali do outro lado, olhas-me nos olhos e adivinhas-me no tarô do teu amor, de sorriso manhoso na voz afinada a fazeres-te bandido para me cantares mundos que ainda desconheço.
Fala-me lá das tuas adivinhações, do quanto esperaste por mim para findar a síntese da tua solidão e de como nos perderemos juntos no oráculo das minhas curvas.
Não é difícil encheres-me o copo e esvaziares-me o dia, pois não?
Faz-me esquecer a permanência aturada das horas passadas no escritório, o rigor estreito da hora de ponta, a dor crescente de não estar sempre presente, a certeza irrestrita do tudo recomeçar amanhã, e leva-me a dançar.
Onde?
Aqui!
É tão fácil…
Desligas a luz e alcanças-me com o vigor de quem me vai obrigar a esquecer o intocado absoluto das minhas convicções.
Isso, assim… Estreitos, lentos, de olhos fechados no perfume do teu peito.
Um, dois, um-dois… Um, dois, um-dois…
Lentos.
Faz de mim a tua atrapalhada Baby enquanto afugentas para lá do horizonte os inimigos vermelhos da minha imaginação.
Lentos.
Um, dois, um-dois… Um, dois, um-dois…
Shhh…
Não percas o ritmo. Não agora. Deixa-te estar. Deixa-te ir. Ambos sabemos onde isto vai terminar e eu só lá quero ir contigo.
Só eu e tu em vagarosas composições, a encher o espaço com esta música lenta que da brisa faz o vento que os corpos incendeia.
Faz-me gemer asterónimos que aqui não posso escrever no medo que eles nos acordem e nos interrompam o prazer.
Faz-me tua agora como me fazias há um tempo.
Vá lá…
Engata-me.
E depois deixa-me a sonhar tranquila.